Dados oficiais mostram que
em 10 anos ocorreram mais de 307 mil casos de intoxicação medicamentosa.
Profissionais do setor farmacêutico e de entidades de classe ficaram perplexos
com a MP e acreditam no veto presidencial
No último dia 25 de abril
o Plenário do Senado aprovou a polêmica Medida Provisória (MP) 549/2011, Lei de
conversão 7/2012, que terá reflexos graves à saúde dos brasileiros. Caso não
haja veto presidencial, medicamentos isentos de prescrição médica (como é o
caso de analgésicos e antigripais) serão vendidos livremente em supermercados,
lojas de conveniência, armazéns e em empórios. Profissionais do setor
farmacêutico e de entidades de classe ficaram perplexos com a MP, que
perigosamente incentiva cidadãos a se automedicarem – levando à problemas
graves de saúde e até à morte, em muitos casos.
O Plenário da Câmara dos
Deputados já havia rejeitado, no dia 10 de abril, o mesmo texto da de autoria
do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), por apresentar incoerências na matéria que,
por fim, incentiva indiretamente a automedicação. O texto, anteriormente
rejeitado pela Câmara dos Deputados, foi inserido de forma obscura na MP, que
trata da isenção de pagamento do PIS/Pasep e Cofins de 22 produtos destinados a
pessoas com deficiencia.
Gustavo de Lima, especialista
em Vigilância Sanitária e coordenador acadêmico de Pós Graduação do ICTQ –
Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade Industrial – afirma que a medida
despreza farmacêuticos como orientadores da população e acredita que o número
de automedicações e intoxicações crescerá vertiginosamente no Brasil.
“A presença do farmacêutico no ato da compra de um medicamento é a
garantia de que o paciente receberá informações necessárias e suficientes
sobre o uso racional do remédio. Freqüência de uso, dose ideal, via de
administração, cuidados de conservação, horários de uso, interação
medicamentosa com outras substâncias, interação com alimentos, principais,
riscos atribuídos, dentre outras informações”, garante o especialista do
ICTQ.
PERIGOS DOS ANALGÉSICOS E ANTIGRIPAIS
Números oficiais mostram
que os benzodiazepínicos (sedativos, hipnóticos, ansiolíticos, relaxantes
musculares e anticonvulsivantes), antigripais, antidepressivos e
antiinflamatórios são as classes de medicamentos que mais intoxicam os brasileiros.
Dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX),
ligados ao Ministério da Saúde, demonstram que 28% dos casos de intoxicação
humana no país têm os medicamentos como o principal agente tóxico. Crianças,
menores de 5 anos, que representam 35% dos casos totais de intoxicação.
Os números, divulgados em
2011, tem como base de dados 2009 e mostram que entre 1999 e 2009 ocorreram
mais de 307.650 casos de intoxicação medicamentosa – uma média de sete
notificações a cada duas horas. Estes índices superam as reações tóxicas
ocasionadas por agrotóxicos, venenos para rato, as picadas de animais
peçonhentos, produtos de limpeza e cosméticos.
“Imagine uma pessoa que compra um simples AAS – ácido
acetilsalicílico. Se ela estiver comprando para substituir o Paracetamol –
porque ela acredita que este medicamento não tem efeito no organismo dela –,
caso misture ambas as substâncias poderá ter uma nefrotoxicidade {efeito
venenoso de remédios} e comprometer seriamente os rins. Os danos serão ainda
maiores se o paciente for uma criança”, garante Gustavo Lima.
Para o presidente do
Conselho Federal de Farmácia (CFF), Walter Jorge João, a decisão dos senadores
é “perniciosa”. Em nota, afirma que medicamento não é uma mercadoria qualquer
que possa ser oferecida ao público, sem nenhum controle sanitário.
“Estamos perplexos, diante
de um retrocesso tão grande que, certamente, colocará em risco a saúde dos
brasileiros. Acreditamos no bom senso da Presidenta Dilma Rousseff”, declarou
ao comentar a esperança de um veto presidencial.
RETRAÇÃO NO SETOR X
INTERESSES ECONÔMICOS
Com a venda indiscriminada dos medicamentos sem receitas médicas,
farmácias e drogarias correm o serio risco de perder mercado, com
possibilidades de retração econômica no setor.
“Essa medida trará à tona um difícil cenário às farmácias e
drogarias do país. Isto porque os medicamentos que são vendidos sem a
prescrição de receituário médico representam, aproximadamente, 40% das vendas”,
conclui o coordenador acadêmico do ICTQ, Gustavo Lima.
Segundo o dirigente do CFF, “vender medicamentos
isentos de prescrição, em estabelecimentos não identificados com a saúde, fora
do controle sanitário e na ausência do farmacêutico, responsável pela
orientação sobre o uso correto desses produtos, só tem uma explicação: atender
ao interesse econômico”, afirma, em nota, a entidade.