O Brasil, ao longo de sua história recente, adotou políticas
explícitas de incentivo à indústria, mas nem todas foram de fato parte
de uma Política Industrial estrategicamente consistente. Os planos de
maior êxito são os Planos de Metas, da segunda metade da década de 50, e
o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), principalmente o II PND, na
década de 70. Todos eles tiveram como ponto central o setor industrial e
foram decisivos para o desenvolvimento e a integração da indústria
brasileira.
A partir da década de 80, os planos
de desenvolvimento foram substituídos pelos planos de estabilização,
que procuravam combater a inflação e estabilizar a economia. Nesse novo
contexto, pouco ou nada se fez em relação à Política Industrial. A
exceção foi o Plano Collor que, reduzindo as alíquotas do imposto de
importação, provocou uma abertura da economia que forçou a
reestruturação produtiva de grande parte da indústria. Essa abertura, no
entanto, não obedeceu a critérios que pudessem ser considerados como
parte de uma Política Industrial consistente e consequente. Esse mesmo
plano iniciou o processo de desestatização, que consistia em transferir
para a iniciativa privada, por meio de leilões públicos, as empresas
estatais. A exemplo da abertura comercial, o processo de privatização
não se relacionava a estratégias que fizessem parte de uma Política
Industrial. Tanto a abertura comercial quanto as privatizações foram
continuadas e aprofundadas no governo posterior, em toda a década de 90.
Nesse
ínterim, políticas setoriais foram implementadas. Logo no início dos
anos 90, instalou-se a Câmara Setorial do Setor Automotivo, que fazia
parte de um programa que pretendia agir dentro das cadeias produtivas.
Ela foi instalada para atender a uma emergência do setor que enfrentava
problemas de queda de vendas, com ameaça à produção e ao emprego. Foram
também instaladas as câmaras setoriais do setor de bens de capital, de
eletroeletrônicos, da indústria naval e outras (35 ao todo). No entanto,
a que logrou pleno êxito foi a Câmara do Setor Automotivo. Elas eram
tripartites e, apesar de suas agendas incluírem tecnologia, comércio
exterior, inovação, qualidade total, ou seja, todos os itens
relacionados aos ganhos de competitividade, no final as principais
medidas aproveitadas e utilizadas para “alavancar” os setores foram as
de renúncia fiscal, com a redução das alíquotas do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI). A contrapartida era a manutenção do nível de
emprego.
A ideia de Câmara Setorial de Cadeias
Produtivas foi retomada, a partir de 2002, com a denominação de “Fóruns
de Competitividade – Diálogo para o Desenvolvimento”.
Os
fóruns foram constituídos para diversas cadeias produtivas – 17, em
princípio – e o processo de seleção dos setores obedecia ao potencial de
cada um em relação às variáveis de emprego e renda; desenvolvimento
regional; exportação e competição com importação.
Com
a crise de 2008, o então governo do presidente Lula elegeu os setores
automobilísticos e da linha branca para concessão de renúncia fiscal
adicionada ao aumento de crédito para os consumidores. Este modelo
estimulou a economia em um primeiro momento, mas se tornou cruel ao ser
perpetuado por longo período. Ainda de 2003 até 2014, tivemos algumas
tentativas, sendo uma destas o implemento da política de Conteúdo Local
voltada, principalmente, para o setor de óleo e gás, que fracassou pela
falta de comprometimento das empresas produtoras de óleo e gás, que se
viram pressionadas para executar seus investimentos, em um cenário de
grande apreciação do Real conciliada com períodos de juros
estratosféricos que agravaram o processo de desindustrialização iniciado
no começo da década de 80. Ainda nesse período, tivemos diversas
edições de Regimes Especiais que, definitivamente, distorceram o
equilíbrio das cadeias produtivas, quase sempre desonerando o último elo
e comprometendo os demais com os custos dos impostos que não poderiam
ser repassados.
Essas foram as medidas de
Política Industrial praticadas nas duas últimas décadas do século
passado e início deste. Ou seja, não existiram ações conjuntas e
coordenadas que pudessem ser consideradas como Política Industrial. Pelo
contrário, equivocadamente, as autoridades econômicas não viam a
Política Industrial como algo relevante para o desenvolvimento do país.
Entendiam que o equilíbrio macroeconômico, por si só, criaria as
condições necessárias e suficientes para o desenvolvimento dos setores
produtivos. O que ocorreu, a exemplo das câmaras setoriais e fóruns de
competitividade, foram intervenções pontuais e específicas em
determinados setores produtivos que provocaram a distorção completa do
sistema produtivo. Para o bem de alguns, outros foram sacrificados,
culminando em verdadeiro desequilíbrio do processo produtivo no país.
Uma
Política Industrial de fato pressupõe um conjunto de medidas que
forneça bases adequadas para criação e manutenção de um ambiente
favorável de negócios para o amplo desenvolvimento, sem favorecimento
específico de áreas e sem preterir os outros setores produtivos do país.
A Política Industrial para ser efetiva terá que considerar as cadeias
de produção preferindo e prestigiando as aptidões e recursos naturais do
país ou região.
Medidas como investimentos em
pesquisa e desenvolvimento (P&D); crédito desburocratizado igual a
todos; parcerias público-privadas; criação de zonas francas e de
processamento para exportação (ZPE); incentivo à inovação, entre outras,
serão extremamente necessárias e são parte de um ambiente de negócios.
Porém, isso somente terá sentido quando aplicado sobre o tripé básico de
sustentação para o desenvolvimento de negócios que são: Câmbio
competitivo e estável, juros competitivos ajustados como no mercado
internacional e carga tributária justa.
A
Política Industrial necessariamente precisa vir acompanhada de ações
complementares na área de comércio exterior e de tecnologia. Com o
processo da “globalização” dos mercados, não existe possibilidade de
fazermos quaisquer políticas que não sejam integradas ao processo
mundial de produção e circulação de mercadorias e serviços. Dessa
forma, a Política Industrial necessariamente terá que ser precedida por
um estudo de aptidões da nossa indústria, disponibilidade de insumos,
áreas estratégicas a preservar e fomentar. É fundamental também que se
fomentem acordos e parcerias de livre comércio entre os países, no
entanto, tais acordos, necessariamente, têm que ser traçados
estrategicamente com base nessas premissas de Politica Industrial.
Ignorar
a indústria como fonte de desenvolvimento do país e não observar os
erros cometidos na nossa história recente é, sem dúvida, fadar o nosso
país a estágio de “Brasil Colônia”.
Não existe uma potência mundial que não tenha sua indústria forte.
Marcelo Veneroso * é membro do Conselho de Administração da ABIMAQ / SINDIMAQ e vice-presidente da ABIMAQ Minas Gerais.
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